sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Conjunção (intemporalidades do ser)


«Vi na minha lembrança, isto é, recordei: chamei ao espírito - exercendo uma faculdade dele - a poeira dos objectos: a imagem»

 «Toda eu sou biologia, memória biológica da alma»

 «Sou um processo imaginário»

 «Meu coração não bate, lateja»

«A minha face é um buraco negro onde a alma se abisma»

«O eu debaixo de mim plataforma onde ando e me deito em equilíbrio, trampolim de onde salto até à manifestação da minha aparência»

«Despeço-me do ar. O ar é o último sítio de que me despeço, guardo memória do ar para depois [de morrer] a minha alma respirar.

«Estou semi-consciente nas convulsões»

«Pus as mãos no meu coração e elas desapareceram, meu coração antropófago. Tenho as mãos presas»

«Eu respiro a aura das pessoas»

«Meu corpo é uma lesão. Alma e corpo ajustam-se, devoram-se um ao outro e eu desapareço»

«Esta sombra caiu do sítio mais puro do céu. toda ela é essência e luz»

«A lua caiu na noite do meu peito, gelo aquecendo o meu útero»

«Ancora – os pés no coração, o coração na alma, a alma nos olhos, na pele»

 «Deus adormeceu nos meus braços como um feto se forma sem dor no ventre da mãe»

«Tenho a esquizofrenia das sereias: gostava de ter carne para amar os homens mas sou só espírito.»   [eu sofria de anorexia, pesava apenas 35 kg)

«Pesar as imagens interiores? Elas não têm peso? Ó, são elas que como pedra me fazem ter os pés na terra»

«Escrever: pôr em acção o próprio ser»

«Introspecção: abrem-se muitas portas mas o caminho é só um, o dos abismos»

«Abro o me coração à vida como se abrisse os pulsos e a minha pena é capital: transfiguro-me na minha própria essência. transmigro para mim mesma. Adormeço ao fundo. as estrelas são o meu berço. Suicidei-me à minha frente»

«A alma gravita em torno de mim, é o meu cometa [porque me segue], enquanto o corpo anda rectilineamente, é o meu cometa perpendicular»

«É da alma que me vem o ar. O ar é interior em mim»
 

in: Fragmentos sem data de um diário

notas, apontamentos ficcionados

(o «eu» como investigação e matéria fundadora de Criação)

Maria João Aguiar da Cunha 
 
 
 

 
 
 
 
 

 

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